Paredes em Transição

O movimento Paredes em Transição é uma rede de amigos que vivem na cidade de Paredes, no Norte de Portugal, que partilham a preocupação de que a debilitante dependência em combustíveis baratos de que a nossa sociedade e economia padecem – e que não está a receber a devida atenção dos vários governos, que parecem actuar na premissa de que o petróleo barato e abundante continuará por cá em perpetuidade – possa vir a resultar em graves e imprevisíveis problemas de que a tecnologia não conseguirá livrar-nos, e que poderão afectar muito negativamente o nosso futuro e o dos nossos filhos. Saiba mais no menu Projecto.

sexta-feira, 29 de outubro de 2010

GLOCAL 2010. Exercício de backcasting

Uma observação que me esqueci de colocar na mensagem anterior: a afluência ao workshop sobre o movimento de Transição, que teve lugar durante as sessões paralelas da tarde do dia 21, na GLOCAL 2010, foi verdadeiramente surpreendente, tendo quase atingido o dobro do número inicialmente esperado. Foi, de longe, a sessão mais participada da tarde e isto diz muito sobre o interesse que o tema da Transição está a despertar no nosso país.


Sobre o exercício de backcasting realizado nessa tarde:

O Energy Descent Action Plan (EDAP), ou Plano de Acção para o Decrescimento Energético de Totnes (PADE), que foi coordenado pela Jacqi Hodgson, teve por base um longo e detalhado exercício de backcasting – um conceito desenvolvido nos anos 70 pelo americano Amory Lovins – que consiste em imaginarmos o futuro que desejamos viver e identificar os passos que teremos que dar para lá chegarmos. Assim, tendo estabelecido os objectivos a atingir no ano de, por exemplo, 2030, teremos que identificar as várias etapas que terão que ser ultrapassadas nos anos anteriores (por ex: 2025, 2020 e 2015) para atingirmos esses objectivos. E há que começar, claro está, no presente.

Ora para criarmos um futuro, é essencial que tenhamos uma ideia bastante razoável do que queremos que ele seja e de quais as condições com que teremos de trabalhar, ou seja, quais as alterações que poderão ser esperadas face às condições actuais: qual deverá ser a população mundial em 2030? Como será o crescimento económico? Como estará o custo das energias? Etc., etc. etc...

Os pressupostos adiantados pela assistência foram os seguintes:

  • A população da Terra será mais numerosa
  • A energia será muito mais cara
  • Decrescimento económico
  • Os efeitos das alterações climáticas fazem-se sentir com maior intensidade
  • Haverá menos alimentos disponíveis
  • Uso racionado dos transportes

Com os pressupostos identificados, fizemos, então, um exercício de visualização, em que cada um de nós imaginou o futuro que deseja para si. A Jacqi convidou-nos a fechar os olhos e a imaginar que acordamos em 2030. Observemos o mundo à nossa volta: como é a interacção entre as pessoas? Como são as habitações, os edifícios, a paisagem… como são as vias de mobilidade e como se efectua a própria mobilidade? O que comemos, como é o panorama ambiental... que sons ouvimos, que cores vemos…

Este é o futuro como queremos que ele venha a ser, e o ponto de partida para a elaboração do Plano de Decrescimento Energético.

Pedimos, então, à assistência para se distribuir em grupos de 6 pessoas e construir o cenário desejado para 2030 e identificar os vários passos para lá se chegar. Dado o pouco tempo disponível, decidimos que nos iríamos debruçar unicamente sobre a alimentação, um dos componentes fundamentais de qualquer EDAP.



Cada grupo elegeu uma pessoa para registar as conclusões nos posters que havíamos afixado nas paredes, e à volta dos quais novas soluções começavam a germinar.


O cenário desejado pela assistência para 2030 foi este:

  • 80 % dos alimentos que consumimos são produzidos em Portugal;
  • Consumimos uma alimentação mais natural, constituída por produtos locais e na época;
  • Novas receitas valorizam estes produtos;
  • A produção local de proximidade é extremamente valorizada pelo consumidor;
  • Os produtos de agricultura biológica são, agora, muito mais baratos do que eram em 2010;
  • Os modos de produção agrícola são sustentáveis, independentes de produtos químicos e de combustíveis fósseis;
  • Foram introduzidas alterações importantes face à dieta que tínhamos em 2010, que incluem um menor consumo de carne e refeições menos abundantes, por opção;
  • Pré-cozinhados e fast-food são quase uma coisa do passado
  • Há mais espaços públicos, repletos de árvores de fruto;
  • Assistiu-se a uma espécie de regresso às origens com imensas pessoas a cultivarem parte do que consomem em hortas domésticas. Hortas comunitárias proporcionam um espaço para os que não têm terreno próprio poderem cultivar;
  • Muitos edifícios têm hortas nos telhados;
  • As pessoas trocam produtos alimentares entre si, muitas vezes em feiras realizadas com esse objectivo;
  • Sistemas agro-florestais permitem produzir alimentos com muito pouco esforço;
  • Refeições comunitárias incentivam a aproximação entre vizinhos, a variedade na dieta e solidariedade entre cidadãos;
  • A água é gerida de uma maneira muito mais eficiente, sendo, muitas vezes, reutilizada
  • Menos desperdício;
  • Produção de carne a nível local;
  • Produtores de agricultura industrial pagam o valor justo pelos serviços que lhes são prestados pela natureza
  • Já existem alimentos disponíveis no mercado sob a forma de pílulas ou pastilhas.





Estes são os passos que a audiência entendeu que deverão ser dados até 2025 para se chegar ao cenário traçado para 2030:

  • Concretização de um novo modelo produtivo agrícola de proximidade;
  • Cidadãos assumem preferência por produtos nacionais ou mesmo locais e biológicos. A inclusão destes alimentos na dieta é vista como um melhoramento na qualidade de vida;
  • Reaproveitamento de águas domésticas;
  • Criar uma taxa elevada sobre a importação de alimentos e incentivos à venda dos produtos nacionais no país;
  • Informação nos menus dos restaurantes deve conter dados como origem biológica (ou não) e quilómetros percorridos pelos ingredientes;
  • Hortas colectivas, mercados de trocas de produtos
  • Redes de distribuição flexíveis, com mercados com horários alargados fomentando o comércio de proximidade;
  • “Cidades agrícolas” – anéis agrícolas em torno das cidades permitem abastecê-las de produtos frescos e de qualidade;
  • Biotecnologia ao serviço da produção e transformação de alimentos

2020:

  • Maior articulação entre decisores políticos e a sociedade civil;
  • Adopção de técnicas de cultivo alternativas;
  • Novos modelos de organização espacial com reconversão de terrenos para o uso agrícola;
  • Rótulos com a “Pegada Ecológica” nos alimentos;
  • Cooperativismo;
  • Qualificação e disseminação regional de conhecimentos com ênfase na sustentabilidade;
  • Estabelecimento de vias de distribuição para os alimentos alternativas;

2015:

  • Choque!
  • Recuperação e difusão de técnicas e práticas agrícolas e pecuárias sustentáveis;
  • Recolha de sementes tradicionais;
  • Valorização da agricultura local;
  • Boicote aos supermercados;
  • Grandes produtores são obrigados a compensar aqueles que são afectados pelas externalidades resultantes da sua actividade;
  • Promoção da entreajuda;
  • Moratória de 15 anos à pesca do bacalhau;
  • Planeamento agro-consciente das cidades;
  • Fim de subsídios perversos.

E hoje, 2010:

  • Alerta!
  • Formação, sensibilização e educação, para modos de vida e alimentação saudáveis, incluindo professores que passarão erra informação aos seus alunos;
  • A produção biológica de alimentos faz parte dos curricula escolares;
  • Alteração dos hábitos de consumo, com preferência por produtos naturais nacionais;
  • Directórios de comida local;
  • Criação de bancos de sementes;
  • Campanha pela disseminação de árvores de frutos secos por todo o país;
  • Mobilização dos líderes de opinião;
  • Autarquias disponibilizam terrenos para criação de hortas comunitárias;
  • Quadro legislativo adaptado à produção local de alimentos, incluindo a alteração das políticas de uso dos solos e o financiamento a agricultores para incentivar a produção nacional;
  • Formação e informação sobre o movimento de Transição.


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