É verdade. Algures quando o meu pai se preparava para tirar um café expresso na máquina lá de casa - logo a seguir ao almoço - e até já depois do jantar, a nossa cidade ficou privada de energia eléctrica. Não houve expresso para mais ninguém. Foi uma simples falha de electricidade, mas a cidade de Paredes paralisou quase totalmente.
Enquanto lá fora o vento soprava as folhas das árvores (e algumas árvores também) e a chuva caía em aguaceiros, no conforto do lar decidi apreciar o dia - um dia de calma como já há muito não vivia. Decidi não ligar o computador - a bateria ainda estava completa - e passar os olhos por um livro que me tinha chegado precisamente no dia anterior e que, curiosamente, se chamava "Back to Basics".
Foi um apagão como não me lembro de ter vivido. Lá fora, um a um, cafés, confeitarias e padarias iam fechando as portas, à medida que se acabava o stock, ou a escuridão tomava conta do estabelecimento. Encontrei a minha tia na rua. Já tinha percorrido três padaria em busca de pão e nada. Até as lojas chinesas estavam fechadas!
A Avenida da República ficou completamente às escuras. Poucos carros passavam. Pelas janelas das casas, podia ver-se a luz trémula das velas. A muitos, valeram as velas decorativas - aquelas que estavam lá por casa há anos, sem nunca terem sido usadas. Também houve quem, pura e simplesmente, fosse apanhado desprevenido, sem velas em casa.
Uns amigos tinham-nos convidado para jantar, mas a ideia deles era ir ao restaurante, e não encontrámos nenhum aberto. Também não tinham comida em casa, uma vez que estavam de partida para umas férias longas. Valeu-nos a comida que tínhamos cá em casa. Jantámos à luz da vela.
O nosso amigo provocáva-me: "Tu estás a gostar disto, confessa!" A verdade é que gostei. Gostei da calma, gostei da experiência de regresso ao passado, e confesso que foi com bastante interesse que observava como as pessoas se iam desenrascando.
Houve coisas boas que sobressaíram desta interessante experiência colectiva: vi as pessoas ajudarem-se umas às outras, cedendo pão ou outros alimentos, velas, lanternas e pilhas. As pessoas paravam na rua para conversar. Gente com quem nunca me tinha deparado parou na rua e metia conversa comigo. Ninguém tinha ideia de quando a electricidade seria restaurada. Soube de pessoas que se reuniram em casa de outras, fora de Paredes, onde ainda havia electricidade, para assistir ao jogo de futebol na televisão.
A corrente eléctrica foi voltando, por zonas. A Avenida da República parece ter sido a última zona de Paredes a ter o abastecimento de electricidade restaurado. As lâmpadas acenderam-se quando já tínhamos acabado de jantar. À luz da vela.
No dia seguinte, um amigo que vive no sétimo andar de um prédio, contou-me que ficou sem elevador e foi obrigado a subir e descer os sete pisos cada vez que precisava de qualquer coisa de fora. As luzes de emergência do prédio não duraram muito, pelo que à noite, nas escadas, a escuridão era total. Ficaram sem água, pois as bombas - eléctricas - que bombeiam a água para os andares superiores deixaram de funcionar. Para cúmulo do azar, foi surpreendido com o telemóvel descarregado. Até o computador portátil estava com a bateria em baixo!
"Nunca me tinha apercebido o quão dependentes estamos da electricidade!", disse-me ele. "O quão vulneráveis ficamos com uma simples quebra de energia!"
E tem toda a razão. Será que, como comunidade, aprenderemos alguma lição desta interessante experiência?
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